Complexa, a doença de Alzheimer está associada a diversos fatores de risco, como idade avançada, hipertensão, diabetes, tabagismo e obesidade. Porém, segundo um estudo da Universidade da Califórnia, câmpus de San Francisco, alterações fisiológicas não são as únicas a contribuir para esse mal que, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), deve afetar 152 milhões de pessoas até 2050. A pesquisa mostra que questões ambientais podem ter um peso ainda maior no desenvolvimento da enfermidade.
De acordo com os pesquisadores, entre os norte-americanos idosos e com deficiência cognitiva, quanto maior a poluição do ar na vizinhança, maior a probabilidade do acúmulo de placas amiloides — depósitos gordurosos no cérebro e uma marca registrada do Alzheimer. O estudo se soma a um conjunto de evidências que indicam que a contaminação atmosférica provocada por carros, fábricas, usinas de energia e incêndios florestais junta-se aos fatores de risco de demência já estabelecidos.
No estudo, publicado na revista Jama Neurology, os pesquisadores analisaram imagens obtidas pelo exame de Pet Scan, que faz uma varredura do cérebro, de mais de 18 mil idosos com média de idade de 75 anos. Os participantes tinham demência ou deficiência cognitiva leve e viviam em cidades espalhadas por todos os EUA.
Os cientistas descobriram que aqueles que moravam em áreas mais poluídas tinham um aumento de 10% na probabilidade de o Pet Scan identificar placas amioloides, em comparação aos que habitavam regiões com melhor qualidade do ar. “Nosso estudo fornece evidências adicionais para uma literatura crescente e convergente, variando de modelos animais a pesquisas epidemiológicas, que sugere que a poluição do ar é um fator de risco significativo para a doença de Alzheimer e a demência”, diz o autor sênior, Gil Rabinovici, do Departamento de Neurologia e do Instituto Weill de Neurociências, ambos da Universidade da Califórnia.
Os participantes foram selecionados para o estudo Ideas, que busca identificar os sinais do Alzheimer em exames de imagem, entre usuários do sistema de saúde norte-americano Medicare. Eles foram diagnosticados com comprometimento cognitivo leve ou demência, depois de uma longa avaliação. Nem todos apresentaram sinais de placas amiloides — em 40%, o exame não revelou evidências da presença dessas proteínas. Segundo Rabinovici, isso sugere que essas pessoas sofrem de outro tipo de demência, não Alzheimer, como as frontotemporais ou vasculares.
Partículas
A poluição do ar na vizinhança de cada participante foi estimada com dados da Agência de Proteção Ambiental, que mediram o ozônio ao nível do solo e a concentração de material particulado atmosférico inferior a 2,5 micrômetros (PM2,5). Os pesquisadores também dividiram os locais em quartis, de acordo com a quantidade de PM2,5.
Eles descobriram que a probabilidade de um Pet Scan positivo para placas amiloides aumentou progressivamente conforme as concentrações de poluentes também cresciam. “A exposição no nosso dia a dia ao PM2,5, mesmo em níveis que seriam considerados normais, poderia contribuir para induzir uma resposta inflamatória crônica”, disse, em nota, o primeiro autor do artigo, também do Departamento de Neurologia e do Instituto Weill de Neurociências da instituição. “Com o tempo, isso pode afetar a saúde do cérebro de várias maneiras, incluindo a contribuição para o acúmulo de placas amiloides.”
O estudo complementa pesquisas anteriores de grande escala que vinculam a poluição do ar à demência e à doença de Parkinson e adiciona descobertas ao incluir uma coorte com comprometimento cognitivo leve — um precursor frequente da demência — e usando placas amiloides como biomarcador da doença, diz o artigo. Outros trabalhos relacionaram a má qualidade do ar a efeitos adversos no desenvolvimento cognitivo, comportamental e psicomotor em crianças.
Sinais financeiros
Um estudo liderado por pesquisadores da Escola de Saúde Pública Johns Hopkins Bloomberg e do Conselho de Governadores do Federal Reserve, nos EUA, descobriu que os beneficiários do Medicare que desenvolvem demência têm maior probabilidade de perder o controle sobre o pagamento de contas seis anos antes de serem diagnosticados. As descobertas, publicadas on-line na revista Jama Internal Medicine, sugerem que os sintomas financeiros podem ser usados como preditores precoces de demência.
“Atualmente, não há tratamentos eficazes para atrasar ou reverter os sintomas da demência”, reconhece a autora principal, Lauren Hersch Nicholas, professora associada do Departamento de Política e Gestão de Saúde da Escola Bloomberg. “No entanto, a triagem e a detecção precoce, combinadas com informações sobre o risco de eventos financeiros irreversíveis, como execução hipotecária e reintegração de posse, são importantes para proteger o bem-estar financeiro do paciente e de suas famílias. Nosso estudo é o primeiro a fornecer evidências quantitativas em larga escala do ditado médico de que o primeiro lugar para procurar por demência é no talão de cheques”, destaca.
Fonte: Correio Braziliense