No mês de combate ao câncer de próstata, médicos alertam para a necessidade de conscientização dos homens sobre os riscos do tumor, que é o mais frequente nos indivíduos após os 50 anos, excluindo-se os de pele. É também, a segunda causa de morte por câncer nessa faixa etária. Segundo especialistas, os homens não têm o hábito de procurar atendimento profissional quando não estão doentes e, no caso do câncer de próstata, a prevenção é fundamental.
De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (Inca), foram mais de 65 mil novos casos dessa patologia diagnosticados no Brasil em 2020. Mais de dois terços dos casos ocorrem após os 65 anos, sendo incomum a ocorrência abaixo dos 50 anos.
O presidente da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), Antonio Carlos Lima Pompeo, ressaltou que o diagnóstico precoce, por meio do exame, é essencial para evitar maiores complicações. “Quando diagnosticado em fases iniciais, que em geral são assintomáticas, esse câncer pode ser curado. Já em fase adiantada, se torna problemático”, enfatizou.
Ao contrário das mulheres, que desde crianças costumam fazer acompanhamento médico, os meninos não têm o hábito de se consultar, especialmente em urologistas. Guilherme Coaracy, urologista do Hospital de Base do Distrito Federal, destacou que parte desse problema é cultural. “Tem a ver com essa questão: as mulheres são orientadas a ter esse costume de cuidar da própria saúde, já os meninos não, e isso vai passando até a idade adulta”, disse.
De acordo com Coaracy, essa falta de hábito, acrescida de preconceito, se torna um problema para os homens em idade avançada, quando o câncer de próstata é mais comum. Ele afirmou ser necessária uma mudança de comportamento, começando na infância. “Se os pais tiverem a prática de levar os meninos para se consultar desde pequenos, isso com certeza terá impacto lá na frente. Teremos uma geração com muito menos preconceito em relação a exames, como o de câncer de próstata.”
Marco Nunes, urologista do Hospital Oswaldo Cruz e membro da Sociedade Brasileira de Urologia, fez coro: “Por conta de uma cultura machista, os homens tendem a demorar muito mais para procurar um médico, seja por vergonha, seja pela conotação de que é um sinal de fraqueza”, explicou o especialista.
Segundo Nunes, outra razão pela qual o acompanhamento urológico, na fase de crescimento do indivíduo, acaba não sendo tão comum é que as mudanças no corpo masculino não são percebidas tão claramente. “As mulheres têm um marco, que é a menstruação. Isso geralmente estabelece o início das alterações no corpo e do desenvolvimento das características secundárias, como crescimento das mamas etc. Já nos meninos, isso não é tão evidente”, apontou.
De acordo com o médico, o papel dos pais é fundamental para que os meninos aprendam a se cuidar e notar aspectos que possam vir a necessitar de atenção no próprio corpo. O profissional ressaltou que, embora o câncer de próstata seja raro nessa faixa etária, o de testículo tem grande incidência, assim como a varicocele, uma dilatação anormal das veias testiculares, também conhecida como varizes da bolsa testicular — principal causa de infertilidade masculina.
“O câncer de testículo é mais fácil de identificar com o autoexame. Já a varicocele só fica evidente em estágios avançados, então, é importante se consultar com um profissional”, destacou Nunes.
Hábito
O urologista Thiago Castro reforçou a importância de os homens terem a prática de ir ao médico desde cedo. Segundo ele, essa atitude é importante não apenas para adquirir o hábito e evitar o câncer de próstata mais à frente, mas também para que meninos recebam orientações de saúde básicas. “O homem precisa ter o primeiro contato com urologista na adolescência, ou até mesmo quando criança, para ter orientações acerca de como se cuidar, lavar o pênis, formas de evitar a gravidez precoce”, elencou.
Para Castro, é preciso esclarecer aos homem que eles também precisam de acompanhamento médico e ações preventivas. O médico disse que o próprio Novembro Azul é importante, porque traz luz ao assunto, mas frisou ser necessário ir além, com campanhas que alcancem o espaço do público mais jovem. “Temos de abordar mais esse assunto nas escolas, televisão e internet, fornecendo informações acerca disso”, pregou.
Para o diagnóstico do câncer de próstata, dois exames são essenciais: a dosagem do PSA no sangue e o toque retal. Como a doença não tem sintomas mais aparentes, os testes são a única forma de detectar um possível tumor maligno. “O exame digital da próstata (exame do toque) e a dosagem do PSA no sangue servem para vigilância do câncer, sendo que, quando alterados, há indicação de biópsia da próstata”, disse o urologista Fransber Rodrigues, do Hospital Brasília. Ele explicou que a patologia não aparece na maioria dos exames de imagem, tais como tomografia e ecografia. Mais recentemente, a ressonância magnética tem sido incluída no diagnóstico do paciente, mas não substitui a biópsia.
Pandemia atrapalha
Dados do Ministério da Saúde fornecidos à SBU revelam que em 2020 houve uma redução de 21,5% das cirurgias para retirada da próstata por câncer, em relação a 2019. A coleta de PSA e de biópsia da próstata, com o exame de toque retal, teve queda de 27% e 21%, respectivamente. O número de consultas urológicas no Sistema Único de Saúde também caiu: foram 33,5% a menos. Decresceram, ainda, as internações de pacientes com o diagnóstico da doença: 15,7%.
No Acre, a média de procedimentos avaliativos despencou 90% desde 2019, ao passo que em Mato Grosso (69%), no Rio Grande do Norte (50%) e na Paraíba (50%) mais da metade dos checkups foi deixada de lado por conta da pandemia da covid-19.
“As coisas estavam andando bem melhores nos últimos anos, mas, aí, veio a pandemia, e não se fala sobre mais nada além do coronavírus. Então, nesses dois anos de pandemia tivemos muita dificuldade em relação a isso”, relatou Coaracy.
O médico do Hospital de Base do Distrito Federal afirmou que hoje não existem políticas públicas voltadas exclusivamente para a saúde dos homens. “Na prática, não existe nenhuma política pública de saúde para os homens. Só temos campanhas no papel”, criticou. Ele disse que é preciso esclarecer à sociedade a importância desse tema.
*Estagiários sob a supervisão de Cida Barbosa
Fonte: Correio Braziliense