Talvez você reconheça essa cena: começa a tocar uma música, em um ritmo de forró, mas que lembra um grande sucesso internacional. Artistas consagradas, como Beyoncé e Rihanna, além de bandas ícones do rock, a exemplo de Guns N’ Roses e Scorpions, tiveram seus sucessos transformados em letras românticas e dançantes que conquistaram o Brasil e criaram uma tradição peculiar na música nacional. São as “versões forró”.Um caso recente chamou atenção do público para esse fenômeno. Miley Cyrus lançou o single Flowers, que, rapidamente, virou sucesso. A brasileira Priscila Meireles, então, gravou uma versão nacional nas redes sociais.Flores virou hit rapidamente e ajudou a divulgar o trabalho da cantora brasileira.“Eu estava em um dia normal, gravando conteúdo para o TikTok, e aí do nada, quando eu fui dar uma paradinha, parece que veio escrito na minha cabeça: ‘E se Flowers fosse um sertanejo, um forrozinho?’. Na mesma hora peguei o celular, já vi ali a letra, fui entendendo como era. Coisa de 10 minutos. A gente foi gravar, gravamos no primeiro tempo e já postei de cara. Eu não sei de onde que veio, acho que foi uma inspiração divina”, contou em entrevista ao Metrópoles.O movimento ganhou força no forró na década de 1990, quando a banda Limão com Mel resolveu se inspirar nas traduções feitas para novelas e criar um movimento que faz parte dos álbuns do gênero até hoje. De acordo com Vidal Junior, pesquisador e coordenador de marketing e artístico da plataforma Sua Música, uma das primeiras criações foi Um Sonho de Amor, inspirada na original The Boxer, de Simon & Garfunkel.“Existe esse período da Limão com Mel no começo dos anos 1990, depois tem a banda [Forrozão] Baby Som, e ali entre 1997 e 2000 o Noda de Caju começa a ficar muito forte com algumas versões. Mas eu acho que quando você fala de versão em forró, você lembra muito da banda Calcinha Preta, que lidera o movimento no início dos anos 2000 com alguns dos principais sucessos de versões de músicas internacionais”, analisa o especialista.Ele explica ainda que o motivo do sucesso das versões pode ser a similaridade com músicas que já fazem sucesso. “Os artistas continuam fazendo porque é uma melodia já vendida, muitas vezes já é um gol. As pessoas fazem versões de músicas que estão nas novelas, ou que estão bombando. Acho que continuam fazendo porque sabem que é uma forma mais rápida da música se popularizar.”Quem concorda com esse pensamento é a dupla Iguinho & Lulinha. A dupla, que trabalha dentro do estilo do piseiro e vaquejada, conta com quatros hits criados em cima de músicas internacionais: Coração Acelera, da original Hear Me Now, do ALOK; Te Quero Mais, inspirada em Sweet Child O’Mine, do Guns N’ Roses; Vai Sentir Falta de Mim, de Paradise, do Coldplay; e Perdi Meu Tempo, um feat com Vitor Fernandes criado em cima de Without Me, da Halsey.“Acho que o atrativo das versões, e o que pode ressaltar um pouco mais [as músicas], é a questão do público já ter certa referência e conhecimento da música original. Então quando vem uma versão mais animada, nessa pegada do vaqueiro, o público curte mais”, analisa Lulinha.Iguinho ressalta ainda que eles viram que esse formato se encaixava com o tipo de forró que eles queriam trabalhar e tiveram uma resposta positiva quando lançaram a primeira versão. “Então decidimos que seria uma boa ideia investir nisso”, conclui.Os direitos das versões
Embora possam parecer simples, as versões exigem um passo a mais antes de serem divulgadas para o público: a compra de direitos autorais. O assunto tem sido comentado em casos recentes como o de Lovezinho, que gerou disputa entre Treyce e Nelly Furtado; mas também outros sucessos, como Coração Cachorro, da qual James Blunt conquistou 20% da autoria.Se no começo os forrozeiros não tinham tanta preocupação a respeito disso, algumas bandas, entre elas a Limão com Mel, entraram os anos 2000 com essa demanda. Vidal explica que esse foi um dos poucos grupos que realmente buscou uma autorização formal dos compositores e gravadoras originais.O processo pode ser longo, mas é necessário. O diretor de artístico e repertório da Som Livre, Gustavo Faria, explica que a primeira negociação é a autoral. “Consultamos as editoras e/ou os autores da obra original, e a partir da aprovação deles é negociado o percentual dos autores originais e versionistas. As autorizações de versões são feitas caso a caso.”Ele reforça ainda que a autorização precisa ser adquirida para cada obra, mesmo que a gravadora detenha o direito para uma música existente. “Novas versões, para novos fonogramas, geram novas consultas e o processo todo se repete individualmente em cada caso”, finaliza.Mas a autorização pode demorar. A cantora Mari Fernandez divulgou as músicas do DVD Ao Vivo em São Paulo em 20 de abril nas plataformas de áudio, mas uma delas segue indisponível quase dois meses depois. Por Que Te Amo tem a base de Paradise, do Coldplay, e a artista ainda não pode divulgar nem áudio, nem vídeo oficiais.Fonte: Metrópoles