Pode até parecer piada, mas um oficial de Justiça do Tocantins, em cumprimento a uma ordem judicial, teve de comparecer ao cemitério para intimar uma vítima de latrocínio.
A situação envolve o juiz Baldur Rocha Giovannini e o oficial de justiça Cácio Antônio, e aconteceu no município de Dueré, no sul tocantinense. O crime foi registrado em abril de 2022, passado um ano e cinco meses, um dos réus foi condenado e, na sentença da 1ª Vara Criminal de Gurupi, está a ordem para intimação da vítima. No documento, assinado pelo magistrado, há o seguinte texto:
“Intime-se pessoalmente a vítima, e caso este seja falecida, intime-se o CADE (cônjuge, ascendente, descendente ou irmão) para que, querendo, execute perante o Juízo Cível, o dispositivo da sentença que condenou o acusado ao pagamento da indenização mínima, no valor de 100 (cem) salários mínimos. Intime-se a vítima (caso houver) da referida sentença, por força do art. 201, §2º, do CPP.”
A vítima era Francisco de Assis Sousa. Ele foi morto a facadas, na casa onde morava, por dois homens que invadiram o local e o mataram para roubar um celular, uma televisão, uma moto e R$ 900.
Intimação da vítima no cemitério
Logo após o resultado do julgamento que condenou o réu a 21 anos de prisão, no dia 26 de setembro, foi assinado eletronicamente um mandado para cumprimento da intimação em nome da vítima, conforme mostra o texto:
“ […] Juiz de Direito Titular da 1ª Vara Criminal da Comarca de Gurupi/TO, no uso de suas atribuições legais, MANDA ao Oficial de Justiça ou a quem este for distribuído, que proceda à: INTIMAÇÃO da vítima FRANCISCO DE ASSIS SOUSA, brasileiro, solteiro, nascido aos 08/08/1954, natural de Grajaú-MA […]. FINALIDADE: Intimar do inteiro teor da sentença […]”
No dia 4 de outubro, a Central de Mandados de Gurupi emitiu a curiosa certidão atestando que o oficial de justiça Cácio Antônio havia ido ao endereço da vítima, em Dueré. Chegando lá, conforme o documento, o servidor afirma ter recebido a informação de que a vítima “reside no cemitério local”.
O oficial de justiça relatou então que foi ao cemitério, chamou duas ou três vezes pelo nome e, até, pelo apelido da vítima. Ao fim, confirmou o esperado: “que o intimando encontra-se mesmo morto”. Por esse fato, deixou de proceder a intimação.
Em nota, o Tribunal de Justiça informou que, de acordo com o juiz, “não foi expedido nenhum mandado de intimação para pessoa morta” e que “a atitude do oficial de justiça deverá ser apurada por órgão competente”. Porém, há o pedido na decisão e um mandado expedido para o cumprimento da intimação da vítima.
No mesmo dia que o Tribunal de Justiça enviou a nota à imprensa, um novo documento do juiz Baldur foi incluído no processo, determinando que a Corregedoria e a Diretoria local do Fórum fossem oficiadas para investigar a conduta do oficial de justiça. Um dos pontos do documento cita que a certidão gerou desconforto e qual seria a conduta correta do oficial de justiça:
Considerando a certidão do Oficial de Justiça acostado ao evento 88;
Considerando que a sentença acostada ao evento 84 foi explícita em determinar a intimação da vítima, se houvesse, ou o CADE (cônjuge, ascendente, descendente ou irmão) para que, querendo, execute perante o Juízo Cível, o dispositivo da sentença que condenou o acusado ao pagamento da indenização mínima;
Considerando que não tem nenhuma decisão para o oficial de justiça intimar ninguém morto em cemitério e que isto não é de praxe no Judiciário;
Considerando a ampla divulgação da referida certidão, que trouxe claro desconforto para este juízo;
Considerando ainda que a conduta correta seria de, no máximo, ter ido ao cartório e ter pegado segunda via da certidão de óbito e no mínimo intimar o CADE (cônjuge, ascendente, descendente ou irmão, conforme determinado.
Fonte: Metrópoles