Escracizada por 38 anos. Foi assim que Madalena Gordiano, 47, (sobre)viveu. Dada por sua mãe para a influente família Rigueira, desde a infância trabalhou para os brancos sem ter a chance de estudar ou viver qualquer outra vida. A história foi revelada pelo ‘Fantástico’, da TV Globo, após denúncias serem registrados por vizinhos no Ministério Público do Trabalho.
Para completar, os Rigueira ainda se apropriaram de suas pensões – de valor mensal estimado em R$ 8,4 mil – por quase duas décadas. – Mulher que manteve idosa em situação análoga à escravidão sabia o que estava fazendo
Madalena foi escravizada por Dalton Rigueiras, professor universitário, segundo apuração do MPT
A escravidão acabou pra quem?
Madalena tinha outros 15 irmãos e sua mãe, incapaz de criá-los, resolveu dá-la para a matriarca da influente família, Maria das Graças Milagres Rigueira. Maria das Graças impediu a mulher de estudar e desde a infância a manteve como serviçal em condições precárias de trabalho, ou melhor, em condições análogas à escravidão, segundo a denúncia do Ministério Público do Trabalho. Dalton César Milagres Rigueira, filho de Maria das Graças, foi apontado como responsável por escravizar Madalena junto de sua mãe. A mulher escravizada se casou com Marino Lopes da Costa, em 2001, em, como apontam investigações, um matrimônio forçado. Marino foi combatente na Segunda Guerra Mundial e por isso deixou duas pensões para sua esposa ao falecer, em 2003. Segundo auditores, o valor chega a R$ 8 mil. Porém, Dalton e Maria das Graças se apropriavam do dinheiro. Marino era tio de Valdirene Lopes da Costa, esposa de Dalton. O casal é apontado como responsável por manter Madalena em cativeiro.
Segundo mostram as denúncias de uma investigação aberta em 2008 contra o casamento, a união foi articulada pelos algozes da vítima para conquistar a pensão e assim fazer o pagamento do curso universitário de Vanessa Maria Milagres Rigueira, formada em 2007 pela Faculdade de Medicina de Petrópolis, no estado do Rio de Janeiro. Vanessa era filha de Maria das Graças.
Depois de concluída a formação da jovem, o dinheiro passou a ser administrado por Dalton. A família alega ter renda de R$ 11,3 mi – combinando o salário de professor universitário do acusado com alugueis -, mas o MPT duvida da afirmação e acredita que o dinheiro de Madalena complementa a renda da casa. Além disso, foi verificado que duas filhas de Dalton e sua esposa utilizaram o auxílio emergencial do Governo Federal. O caso de Madalena é apenas um. Segundo levantamento da Procuradoria-Geral do Trabalho, entre os anos de 2003 e 2018, cerca de 45 mil pessoas foram resgatadas e libertados do trabalho análogo à escravidão no Brasil. Dados do Repórter Brasil estimam que os escravizados têm a mesma cor da vítima da família Rigueiras: 82% das vítimas da escravidão no Brasil são negras. – 71% das vítimas da escravidão moderna são mulheres segundo Índice Global da Escravidão
Apesar de boa parte do trabalho análogo à escravidão no Brasil se manter na labuta rural, casos como o de Madalena também são frequentes. Por volta de 10% dos resgatados das condições de escravização estavam em regiões urbanas em 2019. A família Rigueira não se pronunciou oficialmente e o advogado Brian Epstein, que defende Dalton, afirmou que ainda não teve acesso aos autos do processo. Ele ainda argumenta que os acusados “estão abalados pelo acontecimento e preferem se manter em silêncio”.
Fonte: Hypeness