O assunto do momento nos noticiários e redes sociais é a ômicron. Antes dela, veio a Delta, Alfa e outras que deixaram a população em alerta. Muito se fala sobre taxa de transmissão, quantidade de infectados, sintomas, mortalidade e discute-se sobre novos lockdowns, cancelam-se festas de fim de ano. Mas, a dúvida que fica é: o que são e como essas variantes surgem?
Desde que se começou a falar em variantes do coronavírus, os nomes das mais contagiosas ficaram entre os termos mais procurados do Google. A ômicron, por exemplo, teve um crescimento repentino nas buscas, com pico de pesquisa entre 28 de novembro e 4 de dezembro. Já a Delta, é a mais procurada de todas as variantes, com pico entre 15 e 21 de agosto. Perguntas como “o que é Ômicron”, “quais sintomas da Delta”, “Ômicron significado”, fizeram parte das principais pesquisas dos brasileiros em 2021.
Para entender o que é cada variante, primeiro, é necessário esclarecer como elas surgem. Segundo explicou ao Correio o infectologista do Hospital Anchieta, Victor Bertollo, as variantes são mutações aleatórias do vírus SARS-CoV-2 que acontecem quando há um acúmulo de mudanças genéticas. Esse acúmulo é decorrente da circulação do vírus, “quanto mais pessoas infectadas e maior tempo de circulação na população, maior a chance de surgimento de uma mutação aleatória”, disse o médico.
A alteração do vírus, que acarreta na aparição de uma nova cepa, acontece dentro do corpo humano. Cada vez que ela se multiplica, tem vírus diferentes dentro do corpo. Ou seja, enquanto o vírus continuar circulando pelo mundo, certamente surgirão novas variantes. “Quanto mais a gente controlar a transmissão do vírus, menor a chance de novas variantes surgirem. Mas, como é improvável que a gente consiga eliminar a transmissão do SARS-CoV-2, certamente vão surgir novas variantes. Então é algo que terá que ser continuamente monitorado daqui pra frente”, afirmou o infectologista.
Classificação das cepas
Um fato interessante sobre as variantes é a forma como elas são nomeadas. A Organização Mundial da Saúde (OMS) começou a usar, em maio deste ano, letras do alfabeto grego para nomear as mutações do vírus SARS-CoV-2, a fim de facilitar a discussão por parte do público não científico e também evitar o preconceito contra os países de origem das cepas.
Essas variantes são classificadas em três categorias: de preocupação, de interesse e de monitoramento. As variantes de preocupação são aquelas que apresentam maior risco à população. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), são consideradas variantes de preocupação as linhagens do novo coronavírus que podem se transmitir mais facilmente, são mais resistentes às medidas de controle e prevenção e apresentam maior potencial de causar infecções graves. “São três pontos principais que levam uma cepa a ser considerada de preocupação: a transmissibilidade, a gravidade e a capacidade de afetar negativamente as medidas de proteção. Quando o vírus tem mutações acumuladas que indiquem que ele possa ter vantagem em algum desses três pontos principais, ele é chamado de variante de preocupação”, explicou Victor Bertollo.
Atualmente cinco variantes são consideradas de preocupação: Alfa, Beta, Delta, Gama e Ômicron. Todas elas apresentam maior capacidade de transmissão, mas cada uma tem uma particularidade. A Delta, por exemplo, é capaz de driblar a ação do sistema imune, aumentando o risco de infecção; a Alfa é capaz de se ligar com mais força às células humanas, dificultando a ação do sistema imune; a Beta diminui a ação dos anticorpos, dificultando o tratamento e a recuperação; a Gama tem capacidade de neutralizar e escapar da atividade dos anticorpos circulantes e a mais recente, a Ômicron, ainda está em estudo para saber se é mais contagiosa ou mais letal que as demais.
Em relação às cepas de interesse, elas são menos graves e letais que as de preocupação. De acordo com a OMS, é considerada uma variante de interesse quando o vírus apresenta mutações no material genético com implicações suspeitas no comportamento do vírus, como a alta incidência de transmissão em uma localidade, múltiplos casos e a detecção em vários países, por exemplo. Elas estão em uma linha tênue e são constantemente monitoradas, podendo ser reclassificadas como “variante de preocupação”.
Hoje temos duas cepas no rol das de interesse. Uma delas é a Mu, identificada primeiro na Colômbia e relatada em outros 39 países. Ela não tem grande prevalência global, estando abaixo de 0,1%. A outra é a Lambda, identificada no Peru. Os primeiros estudos sugerem que ela tem mutações que a tornam mais transmissível do que a variante original do coronavírus, mas não causou muitas infecções ao redor do globo.
Além disso, existem cerca de mais sete variantes que são consideradas “em monitoramento”. Elas possuem alterações genéticas que poderiam representar um risco futuro, porém as características e impacto delas ainda estão sendo estudados. São elas: AZ.5, relatada em vários países; C.1.2, identificada primeiro na África do Sul; B.1525, detectada em vários países; B.1526, com surgimento nos Estados Unidos; B.1617.1/B1.620/B.1621, que surgiu na Índia; B.1.630, identificada na República Dominicana e B.1.640, vista pela primeira vez no Congo. Os nomes dessas, inclusive, podem mudar caso sejam reclassificadas.
Quantidade de Infectados
O Ministério da Saúde disponibiliza, regularmente, um boletim epidemiológico com dados sobre o novo coronavírus. No relatório mais recente, o da semana 48, que corresponde ao período entre 28 de novembro e 4 de dezembro, foi informada a quantidade de infectados por cada variante de preocupação no Brasil. De 3 de janeiro até 4 de dezembro deste ano, foram observados 45.410 registros de casos da covid-19 pelas de variantes de atenção no país, detectadas em todas as 27 unidades da federação (UF).
A variante brasileira Gama, surgida em Manaus, é a que mais infectou pessoas no país, de acordo com o documento. Ao todo foram 23.167 pessoas detectadas com a cepa. Ela é mais agressiva, inclusive um estudo realizado por pesquisadores brasileiros e publicado na revista The Lancet Regional Health mostrou que, após o surgimento da Gama no Amazonas, aumentou o número de jovens e mulheres com casos graves da covid-19 no estado. Apesar disso, o estado que registrou maior número de infectados com ela foi o Rio de Janeiro, com 3523 casos.
Em segundo lugar no ranking das variantes com maior presença no Brasil, está a indiana Delta. Ela é a mais identificada nas últimas semanas, de acordo com o boletim epidemiológico. Ao todo foram 21.783 casos da Delta, identificados em 26 UFs, o que representa 47,96% do total de infectados por variantes no país. Um estudo apresentado pela OMS em parceria com o Imperial College, de Londres, mostrou que essa é a cepa mais contagiosa de todas, pois possui mutações na região do genoma responsável pela produção da proteína S, que é a proteína presente na superfície do vírus. Isso significa que ela tem maior capacidade de adesão aos receptores celulares humanos, o que gera altas taxas de transmissão. Por isso, ela é a variante mais presente no mundo, registrada em mais de 130 países.
Logo depois vem a Alfa, originária do Reino Unido. O Brasil registrou, até o dia 4 de dezembro, 449 casos dessa mutação, presente em 18 unidades da federação. A primeira variante de preocupação detectada no mundo, foi responsável pela segunda onda da pandemia que atacou os países do Reino Unido e boa parte da Europa no início do ano.
A Beta e, até agora, a ômicron, são as cepas menos presentes no Brasil. Até o início de dezembro, foram detectados 5 casos da Beta no país, identificados em São Paulo, Bahia e Goiás. Já a ômicron, dados mais recentes divulgados pelo Ministério da Saúde mostraram que o país tem 19 pacientes infectados com a nova variante, além de mais oito em investigação. Do total de casos confirmados, 13 foram em São Paulo, dois no Distrito Federal, dois no Rio Grande do Sul e dois em Goiás. “A grande diferença da ômicron para as outras, que a tornou uma variante de preocupação, é que ela possui na região que chamamos de Spike, que é onde o vírus se liga às nossas células, um grande número de mutações. Isso aparenta que ela é mais transmissível”, explicou a infectologista Ana Helena Germoglio.
Quais os sintomas?
Respondendo uma das perguntas mais feitas no Google neste ano, em relação a todas as variantes, os sintomas delas, no geral, são os mesmo da covid-19. “Não necessariamente uma mutação vai ser mais agressiva, infecciosa ou letal. Não necessariamente elas são piores que o vírus original”, esclareceu a médica Ana Helena Germoglio.
Por esse motivo, a única forma de identificar o tipo de variante responsável pela infecção do paciente é por meio de exame laboratorial molecular, em que é feita a identificação das mutações que são características de cada variante. No geral, os sintomas são tosse seca, cansaço excessivo, febre acima de 38ºC, perda de olfato e/ou paladar, dores muscular, de cabeça e garganta, em alguns casos diarreia, náusea ou vômito e, nos mais graves, dificuldade para respirar.
“Normalmente não existe muita diferenciação de sintomas entre variantes. A Gama, que a gente teve aqui no Brasil no início do ano, começou com muitos sintomas respiratórios, perda de olfato e paladar. Agora, a ômicron aparenta ter menos sintomas olfatórios, como perda de olfato e paladar, e mais sintomas muito parecidos com os gripais”, explicou dra. Ana. Entretanto, é importante alertar que, independente de variante, qualquer sintoma gripal deve ser monitorado. “Não devemos se ater somente a esses sintomas, qualquer sintoma respiratório ou gripal pode ser secundário à covid, não necessariamente a essa ou aquela variante”, disse a infectologista.
A vacina é eficaz?
Apesar de comprovada, muitas pessoas duvidam da eficácia da vacina, seja para a covid em si, seja para as cepas. Mas, para deixar ainda mais claro, estudos comprovam que, até o momento, todas as vacinas disponibilizadas são eficazes contra as variantes circulantes. “Todas as vacinas tiveram uma eficácia muito boa para prevenção de casos graves da doença”, afirmou o médico Victor Bertollo. “Prova disso é que, em locais com altas taxas de vacinados, têm uma incidência menor de casos graves da covid e suas variantes”, complementou a infectologista Germoglio.
No entanto, existem alguns dados que correlacionam a eficácia de cada vacina. “De maneira geral, as vacinas de plataforma de RNA mensageiro, que são as da Pfizer e da Moderna, têm uma eficácia maior. Na sequência, as vacinas de retorno viral como a da Astrazeneca. A Janssen é uma vacina de retorno viral, mas tem uma eficácia um pouco inferior por ser de dose única. E, depois, as vacinas inativadas”, pontuou o infectologista. Essa diferenciação se dá em casos leves da doença. “Isso é importante ressaltar porque, todas elas, têm boa eficácia para casos graves”, ressaltou.
Estudos para avaliar a duração da imunidade contra essas variantes são constantemente realizados. Uma pesquisa feita no Reino Unido, com objetivo de avaliar a eficácia das vacinas Pfizer e AstraZeneca contra a variante Delta, verificou que a imunidade conferida pela vacina Pfizer passou de 92% para 78% após 90 dias da administração da segunda dose, enquanto que a eficácia de AstraZeneca passou de 69% para 61% após 90 dias. Esse é um dos motivos pelo qual estão sendo aplicadas doses de reforço.
Além disso, outra dose da vacina aumenta a resposta imune e é mais eficaz contra as variantes. “Temos dados que o reforço com vacinas de RNA Mensageiro, independente do esquema primário que a pessoa recebeu, o reforço com vacinas da Pfizer e Moderna, por exemplo, tende a produzir maiores taxas de anticorpos protetores. Por isso que o Ministério da Saúde recomenda que o reforço seja feito, preferencialmente, com a vacina da Pfizer”, assegurou Victor Bertollo.
“As vacinas se tornam eficazes contra a ômicron, e qualquer outra variante. O que mostra, por exemplo, a vacina da Pfizer, é que, com três doses, ela se torna altamente eficaz. Mas mesmo que as pessoas não tenham tomado três doses, porque ainda não chegou o tempo de tomar, qualquer imunidade é melhor que nenhuma. Por isso sempre falamos que se deve tomar a vacina”, conclui Ana Helena.
Esperança
Mesmo com a certeza de que novas variantes vão surgir, a vacina traz esperança de que, em breve, poderemos voltar à normalidade. Desde que a vacinação começou, estamos vivendo tempos mais parecidos com os anteriores aos vírus. Máscaras foram flexibilizadas em ambientes abertos, alguns locais já não precisam da aferição de temperatura para entrar, shows, festas e feiras retornaram, entre outros. “Estamos em um momento de retorno muito grande das atividades diárias, mas algumas medidas ainda me parecem muito pertinentes”, diz Victor Bertollo.
O uso de máscara em ambiente fechado e as recomendações de distanciamento social e uso do álcool em gel ainda são lembrados pela OMS, Anvisa e Ministério da Saúde. Essas são medidas necessárias, segundo infectologistas. “As medidas continuam sendo eficazes. Com a população mundial sendo vacinada, os riscos das variantes são menos frequentes”, tranquiliza Dra. Ana.
O mais importante no momento é o avanço da vacinação. Essa é, segundo os especialistas, a única forma de voltar totalmente à normalidade. “Não acho que vamos voltar a ter ondas epidêmicas tão graves no Brasil, sobretudo por conta da vacinação. Mas, para que a gente possa pensar em volta total à normalidade, temos que continuar observando o que vai acontecer nos próximos meses”, assegurou o infectologista do Hospital Anchieta.
À medida que a população for vacinada, tudo vai se tranquilizando. Entretanto, não adianta vacinar só países desenvolvidos como Estados Unidos e os membros da União Europeia. É de suma importância que os países mais pobres recebam a vacinação. “Pode ocorrer novamente o que vemos agora com a ômicron, o surgimento de variantes em outros países por conta da dinâmica de circulação das pessoas. Essa variante vai rapidamente se espalhar para outros continentes como ocorreu agora. Todos os países precisam ser vacinados o quanto antes para evitar o surgimento de outras variantes, se não a gente não vai voltar à normalidade nem tão cedo”, recomendou a Dra. Ana Helena.
Fonte: Correio Braziliense