Pesquisadores finlandeses e americanos das universidades de Turku e Harvard se uniram para tentar entender por que alguns pacientes fumantes parecem perder a dependência da nicotina depois de sofrer um AVC ou lesões na cabeça.O estudo, publicado na revista científica Nature Medicine nessa segunda (13/6), investigou as regiões do cérebro que podem estar relacionadas ao vício em nicotina, e os cientistas descobriram que, na verdade, não é só um pedaço do órgão o responsável pelo problema: um circuito de áreas ligadas por fibras neurais parece estar diretamente ligado com a necessidade de buscar a substância presente nos cigarros.“Um dos maiores problemas com o vício é que não sabemos exatamente onde no cérebro deveríamos mirar com o tratamento. Esperamos que, depois dessa pesquisa, tenhamos uma boa ideia das regiões e redes envolvidas”, explica o neurologista Juho Joutsa, um dos autores do estudo, ao jornal The New York Times.Os cientistas usaram técnicas de estatística para analisar exames cerebrais de fumantes que sofreram lesões no cérebro. Um estudo anterior havia verificado que os pacientes com danos na região chamada de ínsula tinham maior chance de parar de fumar.Observando os exames pixel por pixel, Joutsa e seus colegas perceberam que pessoas que não tiveram lesão na região também parecem ter perdido a vontade de fumar. Dados de outros pacientes foram adicionados, e os pesquisadores desistiram de procurar uma região específica — a saída foi analisar diagramas de conexões neurais para entender como a atividade em uma região se relaciona com estímulos em outras.Os pesquisadores conseguiram localizar redes que conectam várias regiões do cérebro onde as lesões tiveram ação imediata na necessidade por nicotina, e outras que não fizeram diferença para o paciente. Os indivíduos que tiveram lesões e pararam de fumar o fizeram imediatamente: nenhum deles sentiu vontade de acender um cigarro e nem o fez nos meses seguintes.As áreas identificadas também parecem ter ação contra o vício em álcool, abrindo portas para o tratamento de qualquer dependência. Alguns especialistas que revisaram o estudo afirmam que partes dos sistemas identificados são usados no tratamento de transtorno obsessivo compulsivo (TOC) e depressão.“O que estamos percebendo é que nossos alvos terapêuticos não são regiões do cérebro, como acreditávamos, mas circuitos conectados. Se levarmos em conta as maneiras como o cérebro se relaciona, podemos melhorar o tratamento”, explica o neurologista Michael Fox, que também assina o estudo.A ideia é usar estimulação elétrica superficial ou até profunda para mimetizar os efeitos de um AVC ou lesão cerebral para que o paciente deixe de precisar da nicotina. Uma região específica, o córtex medial frontopolar, parece ser uma área cheia de conexões e uma boa candidata à estimulação.Os cientistas ponderam que nem todos os cérebros se conectam de maneira igual, e pode ser necessário mapear o órgão de cada paciente para ter certeza de onde aplicar a terapia. Também não se sabe qual seria a frequência do tratamento, e quanto tempo ele duraria.Ainda assim, o professor de psiquiatria Thomas McLellan, da Universidade da Pennsylvania, nos Estados Unidos, considera que o estudo pode ser um dos mais importantes publicados na última década sobre o assunto.“Ele desmente muitos estereótipos que ainda contaminam o campo do vício: que é algo decorrente de problemas de criação, ligado à personalidade fraca ou falta de moral”, afirma. Ele não fez parte da pesquisa.Receba notícias do Metrópoles no seu Telegram e fique por dentro de tudo! Basta acessar o canal: https://t.me/metropolesurgente.Fonte: Metrópoles