Durante toda a adolescência, a brasiliense Daiely Correia, hoje com 32 anos, sofreu com cólicas incapacitantes que a fizeram desmaiar muitas vezes. O diagnóstico de endometriose profunda veio aos 23 anos, após uma busca incessante por respostas.
“Foi uma adolescência muito difícil. Era socorrida todos os meses para ser medicada no hospital e as pessoas não entendiam o que estava acontecendo. Eu me questionava se aquilo era normal, mas, no fundo, sabia que não era”, recorda Daiely.
O quadro da brasiliense se agravou nos dois anos seguintes, quando a endometriose se espalhou até alcançar a parte da pelve por onde passa um nervo da perna. “Cheguei ao consultório médico mancando de tanta dor. Naquele momento, não conseguia sentir os dedos dos pés”, conta.
Endometriose
A endometriose é caracterizada pela presença anormal de células do endométrio – o tecido que reveste o útero – em outras partes do corpo. A doença acomete principalmente os órgãos da pelve. Em casos mais graves e raros, como o de Daiely, a endometriose pode se infiltrar nos nervos causando inflamação deles e das estruturas próximas.
De acordo com o cirurgião-ginecológico Alexandre Brandão, da Maternidade Brasília, a endometriose pode sair da parede do útero, invadir o intestino e chegar aos nervos que vão para a bexiga, intestino e perna.
No caso de Daiely, as dores nas pernas e no nervo ciático começaram em 2018. Ela chegou a fazer exames na coluna, mas os médicos não encontraram nada, até concluírem que se tratava de um reflexo da endometriose.
Sentir cólica não é normal
Ao contrário da crença popular, sentir cólicas intensas e incapacitantes não é normal. Segundo Brandão, este é um sintoma clássico de endometriose que precisa ser avaliado.
O mais comum é que o diagnóstico seja feito a partir da observação dos sintomas, uma vez que é mais difícil encontrar a endometriose em exames de imagem. Quanto mais cedo é feito o diagnóstico, melhor é a qualidade de vida da paciente.
O Ministério da Saúde estima que uma em cada dez mulheres sofra com as dores da endometriose. Mas o diagnóstico demora, em média, de sete a dez anos para ser feito. Até lá, as pacientes precisam lidar com os desconfortos da condição.
“A cólica menstrual é muitas vezes desvalorizada tanto pela população quanto pelos profissionais de saúde. Cólica intensa, incapacitante e que tira as mulheres das atividades diárias deve ser investigada”, afirma o médico.
Tratamento
Na maioria dos casos, a paciente com endometriose recebe indicação de tratamento multidisciplinar, com intervenção hormonal e mudanças na alimentação. O tratamento cirúrgico é indicado quando há o acometimento de algum dos órgãos ou da função deles, como infertilidade, comprometimento da função da bexiga, dos ureteres e do intestino, dor na relação sexual ou falha no tratamento clínico. O tratamento cirúrgico visa retirar todos os focos de endometriose de uma vez.
Nem sempre a histerectomia (a retirada do útero) é indicada. “A endometriose pode estar fora do útero e, após a cirurgia, a paciente vai continuar a ter dor. Além disso, se a paciente quer engravidar, nós precisamos preservar o útero dela. Muitas mulheres que têm dificuldade para engravidar conseguem depois da cirurgia”, afirma o médico.
Sonho de ser mãe
A endometriose sempre jogou contra o grande sonho de Daiely: ser mãe. A administradora demorou dois anos para conseguir engravidar do primeiro filho, há dez anos, e enfrentou uma batalha para poder engravidar novamente anos depois.
Para Daiely, o procedimento de raspagem dos nervos para retirar os focos de endometriose e se livrar das dores foi a opção encontrada para garantir que ela pudesse continuar a tentar engravidar. Com a preocupação de que o procedimento delicado pudesse afetar os movimentos dela, o cirurgião-ginecológico Alexandre Brandão informou que faria a cirurgia em apenas uma das pernas.
“Aquilo me assustou, mas confiei que daria tudo certo. Depois da cirurgia o doutor me pediu para mexer uma das pernas, deu certo. Depois a outra, que também mexeu. Nesse momento, ele me olhou emocionado dizendo que tinha conseguido fazer a cirurgia nas duas pernas, com sucesso”, lembra a paciente.
O médico tinha conseguido retirar a endometriose que afetava os nervos das pernas e da coluna de Daiely, possibilitando que ela voltasse a andar sem dificuldades e pudesse sonhar novamente em ser mãe outra vez.
A administradora engravidou novamente em 2020, após fazer uma fertilização in vitro. Ela esperava gêmeos, foi uma gravidez delicada, com o descolamento de placenta e sangramentos importantes. “Pensei que ia perder os meus bebês para a endometriose. Foi um dos momentos mais difíceis da gestação”, recorda. Daiely precisou seguir um repouso rigoroso por dois meses.
As dores voltaram durante a gestação, mas ela tinha que esperar pelo parto dos gêmeos. Quando os bebês completaram 1 ano, a brasiliense passou por uma cirurgia para retirar o útero.
“Já estava realizada e não aguentava mais aquele sofrimento causado pela endometriose. Precisava de saúde para cuidar dos meus filhos. Hoje consigo ter uma vida de qualidade”, afirma.
Fonte: Metrópoles